segunda-feira, outubro 25, 2004
O vazio
Ontem na Luz não estavam mais de 20 mil pessoas; na Quinta, cerca de 15 mil. No Dragão também creio que estavam 30 mil, número não muito distante do de Alvalade. A verdade é que nenhum dos três grandes conseguiu garantir mais de meia casa na última jornada. Isto para não falar dos restantes clubes, onde, com a excepção do Guimarães, que também se aproximou da meia-casa (cerca de 13 mil), nenhum dos restantes ultrapassou os dez mil (a esmagadora maioria muito longe disso).
Estes são números difíceis de encontrar no resto da Europa e nem o facto de termos novos estádios faz as pessoas assistirem ao vivo aos jogos da nossa Superliga. Normalmente são diversos os motivos apontados: o sistema, excessivo protagonismo dos dirigentes, maus espectáculos, preço dos bilhetes...
A verdade, é que se estes motivos podem ter o seu peso, não me parecem justificar as miseráveis assistências em Portugal. E não me convencem pela prova do inverso: apesar de todas as condicionantes supracitadas, os jogos entre os grandes estão sempre cheios e as últimas jornadas também assistem a um aumento exponencial de adeptos. Os maus espectáculos e o sistema não desaparecem nestes jogos. Assim sendo, porque é que as pessoas insistem em passar filas intermináveis para comprar um bilhete para um Benfica-Porto e não aparecem para um Benfica-Hereeven?
Quanto a mim são dois os factores que originam esta situação. Em primeiro lugar, a falta de 'bairrismo' dos portugueses, no que ao futebol diz respeito. A desculpa de serem sempre os três grandes a ganhar, não impede de em Espanha os estádios estarem cheios para ver jogos entre equipas mais perto da linha de água do que da Europa. Não é por Manchester e Arsenal repartirem os títulos da última década, que as pessoas deixam de encher o estádio para ver o Norwich-Bolton. Mas aqui não se pode culpar somente os adeptos. A maioria dos pequenos clubes não tem uma política de ligação do clube à comunidade. O ano passado em Coimbra, por exemplo, não havia desconto de cartão jovem/estudante. Em Coimbra, imaginem... . Relacionado com este fenómeno está a 'idolatrização' da equipa. Em Inglaterra, por exemplo, os clubes têm políticas activas no sentido de transformar os jogadores em heróis locais. Em Portugal, jogadores que ganham 2 ou 3 mil contos (muito acima da média nacional), são vistos como carne para canhão, como anónimos que compõem um onze. Pouco se espera deles, para além do pontinho fora a muito custo e pausas de jogos; e da vitória sofrida em casa, por 1-0. Eu espero muito mais de alguém que ganha esse dinheiro. Curiosamente, a maior parte dos clubes pequenos, nem sequer tem nomes nas camisolas! Quando jogam contra os grandes, as bancadas enchem-se (finalmente) para ver jogar os verdadeiros ídolos. Mesmo que não se seja do grande em causa, sabe-se o jogador que se está a assobiar, não se conhece o baixote, ponta-esquerda, que até tem algum jeito para a bola e que por acaso até é da nossa equipa. Basicamente, a relação entre adepto e clube é deixada para as leis do acaso.
Contudo, esta teoria, só explica as bancadas vazias dos pequenos, não se aplicando aos grandes. A estes cabe outro fenómeno, que no caso dos pequenos se adiciona à falta de bairrismo: a ausência de rotinas saudáveis. O português não tem por hábito ir a espectáculos desportivos, o que é estranho num país onde os jornais dessa área são dos mais vendidos. Nos EUA, por exemplo, um jogo de futebol americano começa de manhã, com os churrascos à porta do estádio; em Inglaterra, os pubs enchem-se horas antes do jogo, num ritual repetido todas as semanas por centenas de milhares de pessoas. A verdade é que são fenómenos saudáveis, promovem a confraternização, a convivência. Em Portugal, chega-se em cima da hora, saindo ainda antes do jogo terminar, para não ter esperar muito tempo. Isto os que chegam a ir, é claro. O aliciante de uma tarde no supermercado, onde se gasta inutilmente 2 ou 3 vezes mais que num bilhete, debaixo de ares condicionados atrofiantes, ultrapassa normalmente o fantástico aroma da relva, ou o magnífico som de um chuto numa bola.
Como é que se ultrapassa tudo isto? Parece-me que só há uma solução e esta passa pelos clubes encontrarem as políticas certas para atrairem os adeptos. Para tal, é preciso ter dirigentes com visão, inteligentes. E aí entramos num outro problema nacional...
Comments:
Visão interessante a tua.
Eu penso que temos que partir de um contexto nacional para um contexto local.
Contexto Nacional: o português típico é do Benfica e tem como segundo clube o da sua região. Mesmo sendo do Sporting ou do Porto, o clube da sua região é secundário. Melhor exemplo: Estrela da Amadora. A 4ª cidade mais habitada do país tem a menor média de adeptos. Primeira barreira!
o português gosta de discutir bola e, acima de tudo, gosta de criticar e não ser criticado. Tanto que, quando o seu clube ganha anda mais alegre e quando perde parece que o futebol tem menos interesse e peso na sua vida. Melhor exemplo: qualquer senhor de meia idade, não sócio do seu clube, com filhos e amigos de café q.b. Segunda barreira!
o português tem pouco dinheiro. É um facto! Ninguém o pode negar. Os bilhetes são caros: dantes os sócios só pagavam a chamada quota suplementar nos jogos grandes! Exemplo: funcionário publico com 3 filhos de quadro intermédio. Terceira barreira!
Situação geográfica: o benfiquista de Braga não pode vir à Luz de 15 em 15 dias. Quando vem gasta muito. Se gasta muito já não lhe apetece ir ver o seu segundo clube porque gasta ainda mais...Exemplo: O Quim Zé da Mercearia. Quarta barreira!
Os clubes das capitais de distrito não são representativos na sua grande maioria: Viana do Castelo, Santarém, Bragança, Beja, Guarda, Viseu (chega!!!!). Ou seja, a falta de bairrismo (em Portugal, um distrito é quase que um bairro! ahahaha) surge também daí. Exemplo: Desp. Beja, União Santarém, Académico Viseu, etc. Quinta barreira!
Tinha mais 10 barreiras (dirigentes, jornais, etc.) mas os 110 metros obstáculos já acabaram...e o tempo também!
P.S. - Às vezes dá-me vontade de ficar em casa e não ir à Luz (como com o Nacional). O espectáculo foi fraquíssimo, estava de chuva, o carro fica estacionado a 10-15 minutos do estádio, a fila para entrar e saír é grande, etc. mas sei que, ao fazê-lo estou a deixar morrer o bichinho que anda cá dentro e me faz adorar o futebol. Se bem que adorar o futebol em Portugal é crime porque quem lá anda odeia-o e serve-se dele para se auto-promover e fazer fortunas. Exemplo: presidentes da junta, donos de imóveis, construtores civis que são presidentes de clubes dessa região.
Eu penso que temos que partir de um contexto nacional para um contexto local.
Contexto Nacional: o português típico é do Benfica e tem como segundo clube o da sua região. Mesmo sendo do Sporting ou do Porto, o clube da sua região é secundário. Melhor exemplo: Estrela da Amadora. A 4ª cidade mais habitada do país tem a menor média de adeptos. Primeira barreira!
o português gosta de discutir bola e, acima de tudo, gosta de criticar e não ser criticado. Tanto que, quando o seu clube ganha anda mais alegre e quando perde parece que o futebol tem menos interesse e peso na sua vida. Melhor exemplo: qualquer senhor de meia idade, não sócio do seu clube, com filhos e amigos de café q.b. Segunda barreira!
o português tem pouco dinheiro. É um facto! Ninguém o pode negar. Os bilhetes são caros: dantes os sócios só pagavam a chamada quota suplementar nos jogos grandes! Exemplo: funcionário publico com 3 filhos de quadro intermédio. Terceira barreira!
Situação geográfica: o benfiquista de Braga não pode vir à Luz de 15 em 15 dias. Quando vem gasta muito. Se gasta muito já não lhe apetece ir ver o seu segundo clube porque gasta ainda mais...Exemplo: O Quim Zé da Mercearia. Quarta barreira!
Os clubes das capitais de distrito não são representativos na sua grande maioria: Viana do Castelo, Santarém, Bragança, Beja, Guarda, Viseu (chega!!!!). Ou seja, a falta de bairrismo (em Portugal, um distrito é quase que um bairro! ahahaha) surge também daí. Exemplo: Desp. Beja, União Santarém, Académico Viseu, etc. Quinta barreira!
Tinha mais 10 barreiras (dirigentes, jornais, etc.) mas os 110 metros obstáculos já acabaram...e o tempo também!
P.S. - Às vezes dá-me vontade de ficar em casa e não ir à Luz (como com o Nacional). O espectáculo foi fraquíssimo, estava de chuva, o carro fica estacionado a 10-15 minutos do estádio, a fila para entrar e saír é grande, etc. mas sei que, ao fazê-lo estou a deixar morrer o bichinho que anda cá dentro e me faz adorar o futebol. Se bem que adorar o futebol em Portugal é crime porque quem lá anda odeia-o e serve-se dele para se auto-promover e fazer fortunas. Exemplo: presidentes da junta, donos de imóveis, construtores civis que são presidentes de clubes dessa região.
Como nem tudo é mau queria falar num clube que me agrada muito: Leixões! O povo adora o clube e a ele é dedicado. O estádio do Mar está frequentemente bem composto e a chegada à final da taça não se deu por acaso. Pena Carvalhal ter saído e Abílio não ter tido sucesso no início da actividade como treinador. Mas o seu regresso à Superliga seria efusivamente festejado por mim.
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